Sempre que digo pra alguém que eu passei mais de dez anos da minha vida acampando nos finais de semana, férias e feriados, preciso explicar. Na verdade, eu adoro explicar. Porque eu nunca conheci outra criança, além daquelas lá do camping, que viveu com tamanha intensidade as coisas que nós vivemos.
Era uma vez, uma casa sobre rodas. Um trailler. E essa casinha, a primeira que meu pai comprara, era quase menor que a Caravan que nos levava até ela. Mas tinha tanta dedicação presente naquelas paredes de fibra de vidro. As cortininhas combinando com o estofado do sofá que virava cama, a pia do banheirinho sem chuveiro brilhando como diamante, o toldo que vinha de cima do trailler até o final do cimento de três por três, milimetricamente costuradas pelo meu pai. Sentado no meio do parquinho de diversões, com uma máquina de costura emprestada, ele dedicou dias e dias a cobrir nossas cabeças. Sempre.
E os amiguinhos. Um bando de crianças, uma de cada lado da cidade, unidas no interior de São Paulo com um só ideal: fazer do final de semana ou das férias as mais legais das nossas vidas.
Me lembro muito bem, até hoje, mesmo porque algumas amizades ainda sobreviveram ao caos da vida adulta: Vanessinha, a japinha da turma, um metro e quarenta e nove. Não ia crescer mais que isso. Beto, magrinho, com um tampão no lado direito dos óculos, dono do trailler maior e mais equipado, tinha até computador. Rodrigão, o mais velho, dono do jipinho, objeto de desejo das Maria-gasolinas-mirins. Carol, morena, era a mais maluca da turma, tinha uma chinchila que era o máximo e uma mãe que a fazia colocar abacate no cabelo todo dia. Ricardinho, o bebê Johnson da turma. Fabinho e Fabão. E muita gente que veio depois, veio e foi.
Meu primeiro amor, que me deu uma florzinha e disse que eu era linda bem na descida do escorregador, o primeiro beijo, com um menino, no carnaval, são lembranças delá. Assim como a lembrança do irmão da japinha correndo com a sua Caloi Cross: “Tha, sua mãe está doida atrás de você e você aí com esse menino!” . Aconteceram coisas horríveis, como o estupro de uma menina pelo filho do caseiro. As enchentes. O caso da abelha, eu picada na garganta pelo lado de dentro, jogando futebol ao gritar GOOOOOOOL, ou quando enchemos a cara e acabamos com a energia do lugar inteiro, tropeçando nuns cabos. Havia as brincadeiras dos copos, os jogos da verdade, os WAR, os banhos em conjunto no vestiário, os carnavais, as briguinhas, as noites na piscina, os bailinhos. Ahhhhhhhh os bailinhos. Havia piqueniques, a gente juntava toda comida disponível ou fazia as coitadas das mães cozinharem, pra gente enfiar tudo no jipe e ir pro lago, onde tentávamos pegar ovos de ganso do ninho. Havia as idéias mirabolantes, como quando coletamos todos os trevos de três folhas do mato e colamos numa cartolina com uma quarta folha falsa, cheia de cola tenaz, e vendíamos por dez centavos pros campistas adultos.
Também havia os campeonatos inter-camping onde até tijolo voava, em briga.E, mais tarde, as saídas em bando de carro para a Anzu, os casinhos mais fixos, as bebedeiras mais perigosas, o truco até seis da manhã, os churrascos-raves, as idas à pedra do vento só pra ver o sol morrer ao som de um violão.
Éramos todos irmãos, descobrimos muita coisa, lá. Meu respeito pela natureza, a escolha pelas pessoas puras, minha embriaguez ao sentir cheiro de mato cortado ou o barulho das cigarras à noite, meu medo de cobras, minhas alegrias mais intuitivas, meu amor por animais, minha necessidade de colocar o pé na areia ou na terra, minha ojeriza por urbanomania, tudo veio delá.
Mudamos de camping, de objetivos, alguns de ideais. Mas aquelas estrelas enormes no céu que parecia redondo, ao deitar no colo de alguém na quadra de tênis, jamais vão deixar de existir. Mesmo que hoje isso tudo tenha se transformado numa gigantesca fábrica de cimento de uma multinacional qualquer.
quinta-feira, 31 de janeiro de 2008
Pé no chão
Quem serviu?? Tha Basile às 05:50 7 mais chá?
terça-feira, 22 de janeiro de 2008
O assunto clichê, que não cansa ninguém, nem a mim nem a você.
Por amor a gente se humilha, a gente quebra o orgulho, a gente muda o conceito, a gente respira difícil, a gente esquece da gente.
Por amor, a gente finge, a gente se engana, a gente se ilude, a gente se força a viver ou a gente acaba com a própria vida, corta os pulsos, toma remédios que infelizmente não nos mataram, e graças a Deus que não nos mataram.
Por amor, a gente quebra as promessas que fizemos, a gente vai para onde nunca fomos, a gente apela para quem nunca apelou.
Por amor, a gente mente pra deus, a gente beija o diabo, a gente tenta fazer amor com quem não ama, a gente beija quem não quis beijar.
Por amor a gente se aproxima do céu e ao mesmo tempo do inferno. Por amor a gente odeia, porque o ódio é um amor que ficou doente, mas ainda assim, é amor.
Por amor, a gente fica mais legal para não sentir a dor que definha os ossos, os músculos, o sangue.
Por amor, a gente quebra as coisas ou a gente não se move por mais de uma hora. Por amor a gente procura não ficar parado um segundo sequer para não pensar no nosso amor.
Por amor nos tornamos anjos e assassinos, divinos e amaldiçoados, sensatos e ridículos. Por amor somos dois extremos. Por amor não sabemos quem somos. Por amor enfrentamos o mundo e nos ajoelhamos ante à ele, dando-nos como fracos.
Por amor a gente colhe flores, ou a gente as destroça nas mãos.
Por amor, quantos já não foram enterrados e outros renascidos. Quantos já não foram libertos e quantos não foram banidos? Quantos já não oraram e quantos já não choraram? Quantos litros de amor já não foram derramados sobre as malhas e não se enterraram na areia? Por amor, quanta coisa já não foi feita para ocupar a mente, quantos já não foram tolos, cretinos, dementes? Quantos não se mutilaram? Quantos já se odiaram? Quantos acordaram à noite e quantos que nem dormiram?
Quantas gotas de álcool? Gramas de nicotina? Tarja preta ou novalgina?
Quantos espelhos quebrados e copos reduzidos à cacos. E quantos porta-retratos não foram despedaçados?
Amor, a que me obrigas? Dor em diversas barrigas, frutos do nosso ventre! O quanto nos faz divinos e o quanto não nos faz gente?
Amor, que quando vidas gerou. E quantas delas tirou.
Amor que enternece os maus e que atraiçoa o são. Peso nos nossos pés, chagas nas nossas mãos. Que floresce flores nos túmulos e enaltece o nosso caixão.
Quantos homens por ti se despediram? E mulheres que jamais partiram? E crianças que já nasceram e outras nem se tornaram?
E por mais demônios e dementes, por mais frutos e sementes, por mais presos e animais, o amor nos faz escravos e ao mesmo tempo libertos. Faz-se tudo de errado, porém nada mais que o certo.
Nos faz santos e profanos
Nos faz acertos e enganos
E é por isso e nada mais, que nos tornamos humanos.
Quem serviu?? Thaís SBA às 16:18 11 mais chá?
sexta-feira, 18 de janeiro de 2008
Cagada, vomitada e no Serasa
Problemas parecem ser os seres mais sociáveis do universo. Eles realmente nunca aparecem sozinhos. O bom é que os aprendizados também vêm em grupinho, o ruim é que colocados numa balança eles jamais vão ter mais peso do que os oponentes. Revisemos então as lições dos últimos dez dias.
1- Nem se Jesus reencarnar na sua frente e te pedir, não coma, repito NÃO COMA maionese que parece ter gosto de limão quando ela não foi feita com nada que continha limão. Muito menos se a situação ocorrer num dia de calor de 31 graus.
2- Aprenda a vomitar, sob o risco de ficar com a garganta, o peito e as costas doloridas por duas semanas. Ah e também aprenda as diferenças entre vômito de bebedeira e o de comida estragada. Elas são muitas.
3- Quando for passar um cheque, escreva, no canhoto, nome, celular, RG, medidas de roupa, tipo sanguíneo, orientação sexual e dados cadastrais completos do ser que receberá o cheque, ainda mais se um dia você estiver pensando em fechar sua conta. Por que? Porque certamente o energúmeno vai esperar seis meses pra depositar o cheque, quando a sua conta não mais existir.
4- Tenha muita, muita, acima dos limites eu diria, paciência pra falar com as pessoas da agência do seu (ex) banco, que deveriam ter avisado que seu cheque havia voltado. Antes do seu nome ir pro Serasa.
5- Entenda que moramos no Brasil. E que se você não quiser virose, queimadura de água viva ou coisa pior, deve pegar praia só na Europa.
6- Deixe seu namorado/marido te ver um caco, no banheiro. E ai você logo saberá se ele te ama mesmo.
7- Avise o RH da empresa que você acabou de entrar que seu nome está sujo e explique. Porque se fôr pega no flagra, podem achar que você é estelionatária.
E daqui em diante, eu como lentilha em cima da cadeira, pulo as sete ondas nem que seja do chão no chuveiro, vejo a retrospectiva do ano e visto só roupas novas e branquinhas no dia 31 de dezembro. Assim pelo menos tenho alguma esperança de que a minha primeira semana do ano não envolverá crime, suco pancreático ou os dois. Sai, Zica.
Quem serviu?? Tha Basile às 11:46 5 mais chá?
quinta-feira, 10 de janeiro de 2008
Círculo aconchegante
Ouvi algumas vezes, em algumas palestras e publicações sobre motivação ou liderança, uma expressão: zona de conforto. Na maioria das vezes o que se diz sobre ela se resume a: saia já disso. Fiquei pensando que esse pode ser o mal que me acomete no momento. Digo isso porque a tal zona de conforto é tão quentinha e gostosa de permanecer...
Tem gente que não gosta de mudança. É metódico, pé-no-chão, apegado, chama do que quiser. Já percebi que me falta um pouco dessa acomodação na vida. Que perfeito seria se eu gostasse de fazer todos os dias a mesma coisa, falar as mesmas coisas e com as mesmas pessoas, dominar algumas tarefas profissionais simplesmente por fazer todo dia igual e roboticamente. Seria bem bacana ser um pouco robô.
Já ví que até agora, não deu. Sempre mudei quando percebi que chegava o momento da estagnação, emocional, profissional ou as duas juntas (mesmo porquê não se separa pessoal do profissional, é a mesma vida, certo?).
A única coisa, que talvez seja o lance que vicia nessa tal saída da zona de conforto - não me pergunte a razão - é a exposição, o chute pra fora do mundo que se leva, muitas vezes não é fácil passar vergonha, se abrir, admitir o que falta, mesmo sendo tão necessário pra aprender e viver outras coisas que podem agregar muito além dessas pequenas casualidades do começo. Medo, que bosta de sentimento. Será que é necessário em pequenas doses?
A sorte é que tem as pessoas. Bichos que te ajudam a passar por tudo nessa vida e ainda rir. Roboticamente ou não. Que bom, né?
Quem serviu?? Tha Basile às 02:52 8 mais chá?
terça-feira, 1 de janeiro de 2008
Os Espinhos da Rosa Luíza.
Quem serviu?? Thaís SBA às 07:25 8 mais chá?